Pílulas de neurociência para uma vida melhor

Por que é difícil terminar uma relação?

Dizem por aí que o amor nos cega. Para a neurociência, isso tem um fundo de verdade: ao mesmo tempo que o sistema de recompensa fica encantado com a presença do parceiro e tudo de bom que isso prenuncia, algumas regiões do cérebro responsáveis por julgamentos sociais - se uma pessoa é confiável ou não, por exemplo - ficam um tanto obnubiladas quando contemplam o objeto da nossa paixão, seja filho ou namorado. Não é à toa, então, que a paixão torna as pessoas perfeitas aos nossos olhos, ou ao menos bem mais bacanas do que aos olhos dos outros - quero dizer, ao cérebro dos outros: o amor cega... o cérebro. Pensando bem, se todos temos defeitos, quantos casais não deixariam de se formar sem a ajuda de uma cegueirazinha mútua para pequenos problemas?
A cegueira social amorosa pode até explicar por que, quando as coisas vão mal, quem não está envolvido consegue enxergar razões suficientes para se terminar um relacionamento mais facilmente do que as partes interessadas: o cara é um crápula, o ciúme dela é doentio, ele não para em casa, ela gosta de outro.
No entanto, mesmo quando a cegueira passa e temos consciência de querermos alguém que nos maltrata, despreza, ignora e às vezes até rejeita, a primeira reação do cérebro pode ser... insistir mais ainda em reconquistar o amor da pessoa em questão. Os amigos, cujos cérebros não sofreram as influências do(a) Fulano(a), repetem que ficamos melhor sem ele(a). Sabemos disso,mas... Por que pode ser tão difícil dizer "basta" a um relacionamento ruim? Masoquismo? Culpa? Carma?
De certa forma(mas só de certa forma), vício. O amor de uma pessoa é talvez o melhor dos vícios: algo do qual queremos mais, e sempre, e pelo qual fazemos tudo o que for preciso. Ele estimula o sistema de recompensa do cérebro, que nos traz prazer, bem-estar e felicidade - e nos faz querer mais de tudo isso com aquela pessoa. A expectativa do prazer de estar com ela é motivação suficiente para procurá-la.
O problema é que, curiosamente, quando o que causou prazer no passado deixa de funcionar ou só funciona às vezes, o sistema de recompensa responde durante algum tempo a essas lembranças com uma ativação ainda maior, que motiva o cérebro a insistir quase obsessivamente no assunto até recobrar o bem-estar de antes. Foi o que a antropóloga Helen Fisher descobriu em uma pesquisa: "Você acaba de ser rejeitado amorosamente e não consegue se conformar?", perguntavam os cartazes que ela espalhou pelo campus da Universidade Rutgers, em Nova Jérsei, onde trabalha. Onze mulheres e seis homens responderam, foram selecionados - uma vez comprovado estarem devidamente inconsoláveis - e comparecerem ao laboratório, aos prantos, trazendo na mão a foto do ex-parceiro. Os resultados? Admirar a foto do ex-parceiro ainda desejado deixa o sistema de recompensa em polvorosa, com uma ativação intensa no núcleo acumbente, a estrutura central à motivação, semelhante àquela encontrada nos alcoólatras em tempos de abstinência ao verem um copo. Não é à toa que, durante a fase de inconformismo, essas pessoas sejam capazes de tudo para reconquistar seu amor.
(O que acontece quando o desespero passa,os parceiros abandonados dão a volta por cima e não querem mais ver o outro nem pintado? Isso terá que ficar para outro estudo, pois Helen pegou apenas o telefone dos voluntários, todos estudantes, no alojamento da universidade e, quando quis entrar em contato novamente, todos já haviam se mudado. A ciência tem desses imprevistos, também.)
É exatamente o que nos fz apertar dezenas de vezes seguidas, e cada vez mais desesperadamente, o botão do controle remoto cuja pilha acabou. Você vê que não funciona mais - mas e se, graças à sorte ou ao seu charme, voltar a funcionar?
Se voltar, ótimo - ou não, porque, se a calmaria for apenas temporária, logo começa tudo denovo, e o sofrimento se perpetua enquanto o sistema de recompensa considerar que ainda há chances de sucesso. Uma das descobertas da neurociência mais relevantes à superação da separação é que a excitação do sistema de motivação causada por 50% de chance de sucesso é muito mais forte do que a ativação causada por um sucesso garantido. Por isso, continuar a ver um ex-amante(ou pretendente!) que dá mensagens ambíguas é receita de desastre para o cérebro de quem quer se desligar da pessoa: enquanto achar que há uma ínfima possibilidadezinha que seja de voltar às boas, o sistema de recompensa insiste no assunto e se agarra ainda com mais força ao osso, sem chances de largar. Portanto a receita da reabilitação amorosa é uma só: tempo e abstinência, para dar chance ao seu sitema de recompensa de desaprender a esperar coisas boas com aquela pessoa. E outro prazeres, porque a vida continua.

Suzana Herculano-Houzel

Comentários

  1. Eu li esse texto.Ele é interessante só q meio superficial...

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  2. Todos são bem curtos, daí não dá para aprofundar muito mesmo não.

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