O coelho adormecido

Mariléia conheceu Armando na quermesse. Ficava maravilhada com a maneira como ele arremessava as argolas sem nunca acertar algum dos pinos. Gostava das coisas assim, incertas. Estava cansada de escutar sua mãe dizendo que ela tinha que casar com o Barão; aquela necessidade de dizer aos outros o que fazer. Armando não tinha uma grande propriedade e não usava aquele chapelão de couro de carneiro que era a marca registrada do Barão. Ele vivia a vida como ela lhe vinha e se tinha o dinheiro pra comer até o fim da semana já era muito. Mariléia sabia, pelo olhar de Armando, que ele não tinha intenções de acertar os pinos quando atirava as argolas. Ele gostava de agir instintivamente e depois inventar uma razão pela qual a argola caía no local onde caía. Mariléia tinha certeza, também, que quando Armando a olhasse nos olhos a teria para sempre.
Depois do primeiro beijo fugiram daquele vilarejo para conhecer o mundo. E nunca ficaram mais que um mês na mesma cidade. Não era difícil de conseguir uma ocupação que lhes garantisse o sustento diário com a simpatia e desenvoltura de Armando, e a quantidade de amigos que faziam pelo caminho se tornava cada vez maior. Quando decidiram que se amavam o suficiente para ter um filho ou dois, não faltavam pessoas de todas as partes oferecendo ajuda e presentes para o filho de casal tão estimado.
Foi o maior tempo que ficaram parados em uma só localidade. Viviam em uma casinha emprestada na fazenda de um senhor que um dia empregou Armando e gostou tanto dele que o tratava quase como um filho. Mariléia cultivava alguns alimentos em uma pequena horta e cuidava do pequenino. Armando fazia uns bicos pela cidade mais próxima e trazia algumas coisas que pensava pudessem agradar a sua amada esposa. Eram um casal muito feliz. Ele havia ensinado a ela a arte de escutar e ponderar as palavras e ela o ensinou a não mentir e a ter paciência.
O pimpolho se chamava Jolindo e ensinou aos pais a curtir a madrugada e dormir um pouco menos. Desde pequenininho ajudava a mãe a regar a horta e adorava escutar as histórias de dormir que o pai lhe contava. Quando os pais sentiram que Jolindo estava forte e aventureiro, saíram novamente pelo mundo, passando até por lugares que já conheciam para poder mostrar tudo para o filho. O menino cresceu aprendendo as coisas do mundo vivendo pelo mundo e, assim, teve tantos e tantos professores diferentes. Sabe contar todas as estrelas do céu e nomear cada cidade por onde passou. Pode cozinhar e costurar, e aprendeu a fazer cerveja.
No outono Jolindo conheceu Daniela. A partir de então começou a trilhar um caminho diferente do de seus pais. Se fixou na cidade dela para morar até o fim de seus dias. Porque os filhos não podem fazer o mesmo que os pais. Lógico que essa ideia dele só durou até conhecer Diana, que o levou para velejar pelos oceanos do mundo.

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