Relatos de uma quarentena em Niterói

12.05.20

Você acredita em coincidências? E em sincronicidade, você acredita? Eu acho muito divertido de observar as coisas acontecendo na vida, principalmente as tais das coincidências (sendo coincidência ou não). Talvez eu me sinta menos sozinha e perdida no universo, talvez esses acontecimentos me façam acreditar que tudo tem um sentido.

Eu tenho estado muito sensível durante esse período. Coisas bobas me emocionam e eu tenho vontade de chorar quando assisto ao Jornal Nacional. Hoje eu estava conversando comigo mesma em voz alta na cozinha e me contando sobre coisas que me tocam e me deu vontade de chorar também. Daí eu peguei o meu caderninho e fui escrever um pouco. E eu escrevi sobre essa fase sensível e eu escrevi sobre chorar. Uma das coisas que me contei foi que eu não tenho me dado espaço para chorar tudo o que eu quero. Que quando a gente cresce a gente acaba tendo que esconder um pouco os nossos sentimentos. Que de vez em quando mesmo quando estou conversando com pessoas muito próximas eu tenho vergonha de chorar se as lágrimas dão sinal de vir. Depois de toda essa reflexão e de escrever tudo isso eu vim ao computador para ler os meus emails e abri o email semanal que recebo da Ana Holanda, editora da revista Vida Simples. E olha aí embaixo que coisa mais engraçada.

Tudo bem chorar

Com o tempo, a gente entende que transbordar é também se perceber mais humano e amoroso diante da vida
Sempre chorei. Muito. Lembro quando era criança e passava um comercial na TV mais emotivo ou o capítulo final da novela, meus irmãos me olhavam à espera das lágrimas que, invariavelmente, brotavam. Eu me emocionava.

Com o tempo – conforme fui crescendo –, passei a sentir vergonha disso. Chorar era, para mim, demonstrar fraqueza. Eu sentia como se todas as pessoas estivessem apontando o dedo – assim como meus irmãos faziam no passado – e dissessem: “olha ali a chorona”.

Mas a vida foi me colocando no meio de um rio caudaloso chamado relação, e embotar minhas lágrimas era certeza de afogamento. Então, fazia isso escondida. Passei a ser especialista em desaguar no carro ao dirigir sozinha, no banheiro debaixo do chuveiro ou sentada no ladrilho frio. E quanto mais eu mergulhava no rio que corria dentro de mim – e dava vazão para que eu encontrasse caminhos e seguisse sem me sufocar –, mais abria espaço para me olhar e acolher.

Até que aceitei minha natureza caudalosa. E choro. Em qualquer lugar, na frente de quem for, quando algo me afeta, transpassa. De alegria, de tristeza, de amor, de dor, de raiva, de satisfação.

Hoje, finalmente, entendi que chorar não é expor fraquezas. É se expor.
E fazer isso é para aqueles que têm coragem de mostrar a própria alma e deixar ser visto, num mundo em que a maioria cisma em se esconder.

Ao longo da minha trajetória em Vida Simples, transbordei muitas vezes: de felicidade, esperança e tristeza. Ao longo dos últimos nove anos, li vários textos com lágrimas que escorriam facilmente – e quem já trabalhou comigo se acostumou e aprendeu a me respeitar por isso.

Dei diversos adeuses, aos prantos, a pessoas da equipe que me afetaram de uma maneira profunda – e se transformaram em amigos para a vida. Me emocionei quando escrevi minha carta de despedida, recentemente. E fiquei tocada com o convite para seguir perto por meio desta coluna.

A saber, este texto está nascendo com o típico nó na garganta que precede um bom deságue. É que, eu sei, este espaço será a respeito daquilo que me afeta, da escrita à cozinha; da relação com meus filhos às pequenas delicadezas do cotidiano.

Como lindamente sugeriu Débora Zanelato, editora e amiga-irmã: “por que você não escreve sobre seus afetos?”. Está aí. Olhos marejados, alma nua, pronta para afetar e ser afetada. Amorosamente afetada.










Comentários

  1. Falando em rios em outra conversa, olha "o rio caudaloso chamado relação".
    Da mesma forma que os rios ao longo da história tiveram que ficar calados esboçando quase nenhuma expressão, nós envelhecemos e também muitas vezes calamos nossas emoções. Mas mesmo os calando, vez ou outra, os rios mostram suas emoções e se libertam da imposição do homem. E ainda tem aqueles que culpam a mãe natureza por isso. Nosso sentimento também deve ser libertado das imposições sociais. Liberte-se como um rio! Chore. Adorei seu texto.

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